quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Encontros em Shkoder

Estranhamente nenhum de nós os dois dormiu bem, apesar de nunca termos acampado tão perto de um local sagrado como na última noite. Depois do pequeno-almoço em conjunto, trocamos contactos e despedimo-nos. O calor continua e a 7 km do parque de campismo tenho Burrel, a única cidade existente entre a fronteira e a costa ao longo desta estrada, onde na praça principal um sem número de furgões espera clientes. Na Albânia quase não existem autocarros e o transporte de passageiros é assegurado por carrinhas de 9, 11 e 15 lugares. A regra é simples: existem horários mais ou menos estabelecidos mas só é dada a partida quando estiverem dentro do veículo o número de clientes suficiente para tornar a viagem rentável para o condutor. Durante cerca de 30 quilómetros a estrada é um carrossel autêntico: ora sobe, ora desce, curvas apertadas, camiões a deitarem fumo por todos os lados… Mas a paisagem e às vezes um sorriso vindo da beira da estrada compensam tudo. 





Há, no entanto, uma novidade para os meus olhos… O lago que vejo à minha frente apresenta uma cor como eu nunca tinha visto, um azul que enfeitiça e inebria os sentidos. Sorte a minha que a estrada segue justamente ao longo desse espelho azul, até encontrar duas paredes de rocha verticais que servem de suporte ao paredão de cimento que sustem a água. Tenho um pedido de couchsurfing aceite para amanhã, em Shkoder, que fica a pouca mais de 60 km daqui, por isso hoje aproveito e pedalo até um parque de campismo que fica a cerca de 30 km dessa cidade. Para lá chegar, e depois de deixar de ter a companhia do rio, tenho de seguir por uma zona de planície, já perto da costa, onde o trânsito é infernal. Não admira, esta é a estrada principal que liga a fronteira Norte à fronteira Sul da Albânia. Quem quiser seguir para a Grécia tem de passar por aqui.  Ainda não tinha referido isto, mas na Albânia 70% dos carros sao mercedes. Hummm... tantos Mercedes num país tão pobre? Cheira-me a corrupção! Numa das aldeias por onde passo,um local de mota mete-se a meu lado e a conversa vai parar ao mesmo de sempre… de onde sou, se tenho sítio para ficar, se estou sozinho, se quero erva! O parque de campismo é o primeiro onde fico na vida que tem um desconto para quem chega de bicicleta. Como os donos são alemães, a maior parte das autocaravanas, tendas e jipes, são da mesma nacionalidade.






Como são poucos os quilómetros que separam o parque de campismo de Shkoder, às 13h30 já estou sentado na praça principal da cidade à espera do Arbri, o meu anfitrião de couchsurfing nesse dia. Pelo caminho ainda passo pela maior loja de bicicletas (e talvez a única) que vi no país até agora. Também ele vem de bicicleta para me buscar, aliás, faz logo questão de me dizer que esta é a cidade com mais bicicletas em toda a Albânia e que também é a “capital” cultural do país. Seguimos para o apartamento dele, um espaço amplo, sem divisões e com grafitis e mensagens escritas na parede por outros couchsurfers que já alojou. Diz-me que talvez tenha companhia hoje, porque é provável que cheguem durante a tarde uma Estónia e um Português que estão a viajar juntos. “Um português?” - pergunto eu? Que notícia inesperada! Já tinha perguntado no hostel onde fiquei em Skopje se lá tinham algum alojado naquela altura, mas o últimos que tinham tido tinham sido à duas semanas e quatro semanas atrás, respectivamente. Curioso que também eles viajavam sozinhos.





Estou eu a acordar da minha sesta quando entra o Ardri porta a dentro, acompanhado do Hugo e da Lii. Andam a viajar os dois à boleia desde a Estónia até Atenas. Daí vão apanhar o voo mais barato que encontraram, até à Bélgica e depois seguem novamente à boleia até ao ponto de partida (podem acompanhar a viagem destes dois malucos em www.lobal6vi.blospot.com). Ficamos contentes por encontrarmos outro português  que partilha a mesma paixão. Trocamos impressões, ideias e o Hugo diz-me que os amigos em Portugal o acham maluco por viajar assim! “É que é só sair de lá (de Portugal), p’ra ver que anda toda a gente a viajar, de todas formas e feitios”, diz o Hugo. “Pois é Hugo, felizmente o mundo ‘tá cheio de malucos!”, penso eu. O Arbri oferece-nos uma bebida de boas vindas (desde que aterrei em sofia que, esta é uma prática corrente, por todos os países onde passei – foi assim na casa da Iva, no camping em Vranje e no hostel em Skopje. Saímos, comemos um burek e caminhamos até ao lago que fica na zona oriental da cidade. Pelo caminho o Arbri explica-nos como funcionam as coisas na Albânia: tudo é permitido, menos matar! Existem muitas máfias albanesas, mas só uma actua no país – o governo. As outras encontram-se espalhadas por essa europa fora. Por outro lado diz-nos que é também um país onde as pessoas sabem receber os visitantes (basta olhar para o Arbri) que vivem com pouco mas com um sorriso na cara. Se esta é a visão do país de um dos seus habitantes, quem sou eu para discordar? De seguida vamos a um restaurante, pedimos uma girafa de 3 litros de cerveja e uma especialidade local para dividir entre todos. A este ponto já eu decidi que amanhã vou deixar aqui a bicicleta, pegar na mochila, na comida, na tenda, seguir o conselho da Bernii e ir a  Thethi, onde se encontra o ponto mais alto dos alpes dináricos. Antes de nos deitarmos ainda temos tempo de deixar um desenho nas paredes do apartamento: o Hugo e a Lii fazem a sua “marca registada” – um sol – e eu deixo uma onda. 





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