Acordo feito num farrapo. Dormi
pouco, está calor e a bike está à minha espera! Ainda tento arrastar a partida,
mas não há nada a fazer, tenho de continuar. O meu destino é o Parque Nacional
de Mavrovo, que fica já perto da fronteira com a Albânia, mas para lá chegar
vou demorar pelo menos dois dias. Agora já não preciso de usar a auto-estrada.
Há uma nacional, pararela à primeira, muito menos movimentada e que atravessa
vilas, aldeias e campos. Gosto especialmente da uma da tarde, quando o
chamamento para a oração ecoa dos minaretes das mesquitas. É um som que me
transmite uma tranquilidade desconcertante, mesmo não percebendo patavina do
que querem dizer as palavras entoadas.
A paisagem vai agora mudando lentamente
e a oeste começo a vislumbrar novamente montanhas com neve. O cenário é
fantástico mas vai ser algures por ali que eu vou ter de subir amanhã! Depois
de umas horas de terreno plano, a estrada sobe para depois começar a descer
para um vale enorme que faz uma curva e segue para sul. No limite norte do vale
fica Tetovo, uma cidade feia, com blocos habitacionais enegrecidos pelo passar
dos anos. Paro numa esplanada para verificar se existe algum parque de campismo
aqui na zona. Nada! Além disso esta é uma área muito povoada, o que torna
complicado encontrar um espaço escondido para colocar a tenda.
Continuo… à
saída da cidade paro para tirar uma foto a uma igreja, viro-me para tirar outra
a um casamento que passa e deixo a máquina cair no chão. Nem acredito! A objectiva
saltou fora, está arrumada! É a segunda em pouco mais de duas semanas! Fico
variado comigo mesmo, meto-me novamente na bike e vou falando sozinho e
maldizendo a minha sorte. Apetece-me atirar tudo para o chão por causa da minha
falta de jeito! Entretanto vou passando por vilas e aldeias que ostentam
bandeiras da Albânia… em território macedónio! Hum… há aqui qualquer coisa que
não bate certo! Vejo também os primeiros homens envergando o Plis, o típico chapéu albanês feito de
algodão prensado, e os primeiros talhos albaneses: os animais jazem estendidos
do lado de fora do talho, uns meio abertos, outros já esfolados, outros
pendurados sem cabeça, outros só com cabeças alinhadas, há de tudo!
As pessoas
cumprimentam-me alegremente, acenam, dizem uns “hello” perfeitos. Todos os dias
cumprimento toda a gente por quem passo, a maior parte retribui, às vezes
buzinam e levantam o polegar como sinal de encorajamento, outras vezes são
camiões com buzinas que fazem uma música – é uma experiência brutal por si só!
Nunca estou sozinho. Mas estas pessoas cumprimentam-me de forma diferente, mais
efusiva! Isto é tudo muito giro mas são quase 6 da tarde e eu ainda não decidi
o que vou fazer em relação ao local para dormir. Gostivar, que fica a apenas 5
km, vai ser a última grande cidade que irei apanhar nos próximos 7 ou 8 dias
por isso é o único local onde poderei comprar uma máquina fotográfica nova ou
usada. Decido ir até lá. No centro da cidade vejo uma agência de viagens (nos
países por onde tenho passado são às centenas, especialmente porque vendem
viagens de autocarro para vários destinos na Europa), paro e pergunto ao rapaz
que está sentado à porta se conhece um local onde se possa pernoitar por pouco
dinheiro. Chama-se Ardi e está a trabalhar na agência de viagens do tio durante
as férias de verão. Ao lado dele está um senhor sentado numa grade de cerveja.
Dispõem-se logo a ajudar-me, fazem telefonemas, perguntam quanto quero gastar
(o mínimo possível, claro! eheh) e levam-me até um hotel. Eu só carrego a
mochila, porque sou proibido de levar a bicicleta. Um deles faz isso por mim.
Entretanto vou conversando com o Ardi e digo-lhe que no dia seguinte não me vou
embora de Gostivar sem passar pela agência de viagens para me despedir.
Aproveito e pergunto-lhe o porquê de tantas bandeiras albanesas nesta zona.
Fácil! Estamos perto da fronteira com a Albânia, metade da Macedónia foi
território albanês até 1913 e esta zona é quase exclusivamente habitada por
albaneses, que vivem num país que não reconhecem como seu. Daí a necessidade de
afirmação da sua identidade, especialmente perante a minoria turca, por quem a
maior parte dos albaneses deste vale tem um ódio muito particular (toda a
região balcânica esteve sob o domínio turco, exercido pela força, por mais de 400 anos).
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