segunda-feira, 8 de julho de 2013

Sofia - Tran

O plano inicial para os primeiros dias de pedal era seguir para Sul e entrar na Macedónia pela fronteira Este, mas a Iva começou a falar-me de um canyon e de um lago na zona da fronteira com a Sérvia. Decido que vou por aí. A distância para Skopje é a mesma e eu já fiz parte da estrada que segue para Sul, quando apanhei o autocarro para Rila. Vou às compras, preparo tudo e despeço-me da Iva. Vou ter saudades deste sítio. É sempre um sentimento estranho pensar quando voltarei a ver estas pessoas. A saída da cidade é um caos… 2 faixas de cada lado, sem espaço para a bike.  Carroças, Ferraris, camiões, motas, pessoas… tudo anda ali no meio. Depois de um pequeno engano já estou na estrada nacional para Tran, a vila que fica a 15 km da fronteira com a Sérvia. Está um calor infernal e as pernas ainda não estão habituadas ao esforço. Cada vez o trânsito vai diminuindo mais e dando lugar à pacatez das aldeias. Paro na sombra duma paragem de autocarros para comer. 
   



As pessoas cumprimentam-me, meio a medo. Depois de uma subida longa, o céu começa a ficar cinzento e quando chego ao topo vislumbro ao longe trovoadas por todo o lado. Ainda não são 4 da tarde, chego a Bresnik e há festa na cidade. Depois de hesitar, decido meter pelo meio da multidão. Há bancas de todos os tipos, com roupa, fruta, utensílios agrícolas e farturas. Começa a chuviscar e a trovejar. Já não vou ter tempo de sair daqui para ir procurar um local para acampar, por isso tento encontrar na saída da cidade algum alojamento. Não há! Mas existe o quartel dos bombeiros. Estão 2 bombeiros à porta e meto conversa. Não falam inglês mas por gestos lá explico que quero arranjar um sítio para meter a tenda. Perguntam-me se tenho dinheiro fazendo um gesto com a mão e apontam para um hotel com aspecto luxuoso no topo da colina que abraça a cidade. “Não amigos! Não tenho muito”. Ainda tento um “choradinho” e pergunto se dá para acampar por ali, no relvado ao lado do quartel. Nada feito “Fire here”. “Ok, já percebi que é o quartel, paciência…”. Dizem-me para tentar na polícia e é o que faço. No meio da rua, agora quase deserta de pessoas que fogem da chuva, vejo um carro da polícia. Paro e pergunto por um sítio para meter a tenda. Um deles sai do carro e faz sinal para o seguir. Vai à esquadra buscar a chave do jipe da polícia e eu vou a atrás dele na bike. Paramos numa bomba de gasolina à entrada da cidade. O polícia sai do jipe e dirige-se aos funcionários, depois indica-me o relvado por detrás da casa que serve de loja. É aqui que vou dormir, seguro porque esta está aberta 24h. Quando estou a acordar de uma sesta de 3 horas sinto umas pancadas na tenda! Saio e vejo o funcionário a chamar-me. Está um carro avariado a ser reparado. Sou levado até uma senhora que por ali está. É mulher do mecânico que tenta reparar a avaria, vive a 50 metros dali e quer falar comigo. É simpática e conversamos um bocado, depois apresenta-me ao marido, pergunta-me se estou bem, se preciso de alguma coisa, se tenho comida e que se quiser ou tiver frio posso dormir dentro da loja da bomba, que sempre é mais quente. Não quero incomodar, por isso recuso gentilmente. Tento meter o fogão de campismo a funcionar pela primeira vez mas um problema no adaptador da botija, gasta-a em menos de um minuto. Lá se foi a comida quente até encontrar um fogão novo. Quando rodam o turno, oiço os funcionários dizer “Politzia!”, ou seja, “aquele gajo está ali porque foi a polícia que mandou”.





No dia seguinte acordo e ainda chove, já lá vão 16 horas seguidas. Vou ter de continuar por isso equipo-me para tal, só falta algo para os pés por isso peço dois sacos de plástico à funcionária do novo turno, que ainda me oferece um café. Anda-se devagar com a chuva, entre uma paisagem que começa cada vez mais a ficar montanhosa e bela! Passo por pessoas que caminham na beira da estrada sem qualquer protecção para a chuva. Uma delas senta-se ao meu lado quando estou sentado numa velha paragem de autocarro para comer algo. É uma velhota sem dentes! Fala e ri muito. Eu só rio e digo “Sorry, english!” A estrada vai empinando cada vez mais, tentando vencer o desnível que as montanhas apresentam. 


Quando estou a 2 km de Tran, no topo da última subida, sou mandado parar por uma brigada da polícia de fronteira búlgara. Não falam Inglês. Por sinais lá conseguimos comunicar. Pedem-me o passaporte. Está um ambiente estranho na conversa e começo a preparar-me para me pedirem um “donativo”, imaginando já mil desculpas para me safar, que estou de bicicleta, que não tenho dinheiro! Um deles, de camisa aberta, pede-me o passaporte. Vê o nome e confere se sou eu na foto. Outro liga para um colega que, em inglês, manda perguntar como vim parar aqui. Digo que vou para a Itália, e que apanhei um avião de Lisboa para Sófia. O de camisa aberta pergunta-me o nome, eu repondo, sorriem e mandam-me seguir. Continua a chover, a tenda está encharcada dentro do saco e acampar hoje só mesmo em último caso! Na praça central de Tran fica um hotel 3 estrelas! Sento-me na esplanada e peço uma cola. É a forma que tenho de aceder ao WIFI do hotel. Procuro um alojamento nas redondezas. Aqui pedem um balúrdio, para o meu orçamento, e eu prefiro dar o meu dinheiro a alojamentos locais, suportando directamente a economia local. Vejo que a 6 km daqui há uma casa que aluga um dos andares a turistas e, melhor, tem cozinha toda equipada. 


Reservo através da internet e 2 horas depois estou lá. Busintsi, o nome da aldeia onde fica o alojamento, fica numa vertente montanhosa e é o final da estrada. Sigo as indicações de uma placa de madeira e deixo o alcatrão, que cobre só a rua principal da aldeia. Esquerda, direita, chuva, lama e estou em frente ao portão da casa. Bato com força. À porta vem um rapaz de meia-idade. Tento dizer que fiz uma reserva à 2 horas atrás para uma noite. Manda-me entrar! Chama-se vasco, é o filho dos donos da casa e está de férias do trabalho como pedreiro em Paris. Apresentações feitas, últimas limpezas e lareira a funcionar! Está preparado um fim de tarde de descanso, a ver as montanhas a partir da janela do quarto e a ouvir a chuva lá fora.


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